Os advogados de defesa do ex-policial militar Kássio de Mangas Santos, anunciaram que irão pedir a nulidade da sessão de julgamento que condenou o réu confesso pela morte de Emily Karine Miranda Monteiro, a mais de 24 anos de reclusão em regime fechado.
Hélvio Farias, Daniel Modesto e Dione Melo, que compõem a equipe contratada para defender Mangas, disseram que em vários momentos seu cliente teve seus direitos cercados em plenária.
“Vamos apresentar as razões na instância superior, pois ficou muito claro o cerceamento de defesa. Nós não pudemos esclarecer a realidade, porque a magistrada cerceou o que está previsto no Código de Processo Penal. A nós não foi permitido, por exemplo, fazer perguntas para as testemunhas, que tivessem relação com as mensagens que foram apresentadas no processo. Não pudemos mencionar o nome do ex-namorado de Emily, nem fazer perguntas relacionadas a esposa desse ex-namorado. Isso foi um cerceamento claro, porque nós estávamos mencionando uma pessoa que foi apresentada pela própria testemunha da acusação”, afirmou Farias.
Outro ponto apresentado pelos advogados para pedir a anulação do procedimento, é quanto ao silêncio do ex-PM. Para Hélvio, o Ministério Público ignorou o direito do réu garantido na constituição.
“A promotora utilizou o silêncio de Kassio para atacá-lo em frente aos jurados. Isso é uma nulidade clara existente no Código Penal Brasileiro. Ele tem esse direito, em permanecer calado, e ninguém pode falar nada. Quando ela diz “você não vai me responder por que sou mulher “, ela está tirando dele essa garantia.
O nosso cliente foi orientado a não falar porque ele estava sendo hostilizado o tempo todo.
Kássio respondia as perguntas feitas pela promotora livremente. Mas, a partir do momento que ela começou a utilizar as perguntas para fazer as insinuações e utilizar fatos que aconteceram há mais de dez anos na vida dele, ele se sentiu pressionado, porque ali ele estava para responder os fatos que estavam sendo julgado e, por este motivo, se reservou ao direito de ficar em silêncio. Ela [promotora] sendo uma servidora de um órgão fiscalizador e conhecedora da Lei, acabou violando essa Lei, ofendendo o direito dele ao silêncio. Com isso, cavou essa nulidade, emplacou a nulidade no processo”, enfatizou.
A defesa de Kássio Mangas salientou ainda, que não foi constada tese no momento da quesitação, e que proposições levantadas, debatidas e fundamentadas em plenária, foram recusadas pela juíza, e não foram colocadas nos quesitos para serem votadas pelos jurados.
“Cerceamento mais claro que esse não existe. Isso é furtar do réu o direito da tese dele ser apresentada aos jurados para que eles julguem. Nós queríamos a tese da semi imputabilidade e a juíza alegou que não existia nos altos. Os exames psiquiátricos foram referidos pela defesa e reiterados por três vezes, nunca foram feitos. Nós solicitamos o vídeo das câmeras de segurança integral e não foi juntado no processo porque foi negado. Nesse primeiro ato foi solicitado que o ex-namorado da Emily fosse em juízo depor e tantos outros requerimentos que foram negados a ele. Outro exemplo é que não se usa em plenário, argumentos de autoridades baseados em decisões de admissões de denúncias e pronúncias. E o assistente de acusação pegou julgamentos do STJ, do Tribunal de Justiça e leu a ementa, mesmo sabendo que não podia, usando de argumento de autoridade disso para confundir os jurados”, afirmou Daniel Modesto.
O trio de advogados falou ainda sobre que não tentava a absolvição de Kássio, mas sim a redução da pena, haja vista que ele agiu motivado por forte emoção.
“É importante que a sociedade compreenda que nós não fomos pedir a absolvição. Nós fomos ao plenário mostrar a realidade. Ele agiu movido pela emoção e essa emoção deve ser reconhecida como causa de diminuição de pena. Nós pedimos que fosse reconhecida a violenta emoção e reconhecendo isso, não quer dizer que não houve um homicídio, que não teve o feminicídio,
Ele tinha que ser julgado e condenado pelo crime que praticou, mas não por uma qualificadora que pelos laudos necroscópicos demonstra que não houve. As provas dos altos comprovam que não foi utilizado o meio cruel”, finalizou Melo.
O crime
Emily foi morta com três tiros no dia 12 de agosto de 2018, com três tiros. Ela foi baleada dentro da casa que morava no bairro Pacoval, em Macapá. A vítima era cabo da Polícia Militar e chegou a ser socorrida, mas morreu no Hospital de Emergências (HE).
O casal teve um relacionamento de quase dois anos. Após os disparos, Mangas fugiu do local e se apresentou dois dias após na Delegacia Especializada em Crimes Contra a Mulher (DECCM). Como estava com o mandando de prisão decretado, ele foi encaminhado ao Centro de Custódia do Zerão, na Zona Sul.
Durante o processo foi descoberto que contra Kássio Mangas haviam dois boletins de ocorrência por crime de violência doméstica. As vítimas eram duas ex-namoradas do mesmo.
Na cadeia ele se envolveu em uma confusão com uma agente prisional, após uma discussão pelo uso de celular. Na ocasião o preso teria ameaçado a agente.
O julgamento
Kássio de Mangas, de 34 anos, foi condenado nesta segunda-feira (22) a 24 anos e 9 meses de prisão, inicialmente, em regime fechado, sem direito a recorrer em liberdade.
Ele também foi sentenciado a 11 meses e 21 dias de detenção por fraude processual, e ao pagamento de multa no valor de R$ 13,5 mil aos pais da vítima.
De acordo com a decisão da juíza do Tribunal do Júri, Kássio foi sentenciado e condenado por motivo torpe, meio cruel, premeditado, com pena base de 18 anos e 9 meses de reclusão, agravada para 24 anos e 9 meses, pelas qualificadoras e por culpabilidade. Foi juntado na dosimetria da pena, por na época dos fatos ser Policial Militar, fixada em 11 meses e 21 dias de detenção. Somando 24 anos e 11 meses de Reclusão, e 11 meses de detenção posterior à de reclusão. Ele permanecerá preso, por não ter cumprido o mínimo para progressão da pena. A juíza declarou a perda do cargo na instituição, por incompatibilidade.