ELLEN COSTA
Com exclusividade, a mulher de 22 anos que presenciou a execução do marido e teve dois dedos da mão direita decepados, conversou com nossa equipe.
Bastante abalada emocional e psicologicamente, Beatriz Tavares preferiu não se expor, mas detalhou por meio de mensagens as horas que antecederam a barbárie. Ela contou que o marido foi morto após intervir em uma confusão que aconteceu em um bar, onde ocorria um aniversário infantil, e garantiu que Anderson Lima Ramos não tinha envolvimento com o crime organizado.
“Eu preciso limpar a imagem do meu marido. Mataram ele dizendo que a gente era faccionado e isso não é verdade. Anderson era amarrador de verduras. Todos os dias ele saía pra trabalhar, eu ficava em casa com a nossa filha e no final de semana a gente ficava juntos. No sábado, a gente tinha recebido o convite para ir nesse aniversário, no bar do patrão dele. Lá teve uma briga e ele foi apartar a confusão. Um rapaz que trabalhava com ele na horta pensou que meu marido tava no meio da briga. Ele foi pra cima do Anderson, pra furar ele, eu me meti e esse homem disse que aquilo não ia ficar assim, dizendo que os caras vinham pra disciplinar ele”, relembrou a mulher.
Após essa discussão, segundo Beatriz, um grupo de indivíduos chegou na festa e chamou Anderson pra conversar, mas não demorou a ir embora.
“Eles só disseram que não iam fazer nada, só que, a partir daquele momento, não era mais pra um falar com o outro e foram embora. Passou uns minutos, eles voltaram e perguntaram quem era Bia. Eu disse que era eu, então eles me chamaram e disseram que sabiam que eu tava jogando com a APS. Daí, ficaram com esse negócio de facção e eu disse que eu não era envolvida, que meu marido não era envolvido com esse tipo de coisa. Eles foram embora, passou um tempo, a gente também foi”, ressaltou.
Ao chegar em sua residência, o casal deitou e dormiu. A vítima disse que acordou espantada com quatro homens no quarto.
“Eu me assustei porque eles me bateram. Então chamei meu marido, pra ele acordar. Eles mandaram a gente ficar de joelhos e um já disse que eles foram pra matar ele, outro me deu um tapa e disse que eu não ia morrer, que eu ia ficar viva como aviso pra facção”, recordou Beatriz.
Com a voz embargada e chorosa, ela lembrou das últimas palavras ditas pelo companheiro, antes do mesmo ser executado com um tiro na cabeça.
“Ele falou, ‘não me mata, eu tenho família, não me envolvo com isso’, foi nessa hora que deram o tiro nele. Meu marido caiu perto de mim, eu me arredei um pouco, com a esperança dele ainda tá vivo”.
Perguntada sobre o momento em que ela teve os dedos arrancados, Beatriz revelou que sentiu mais a morte de Anderson do que a dor de ter seus membros decepados a sangue frio.
“Quando puxaram a minha mão, eles disseram que iam cortar os meus dedos para mandar pra facção. Eu olhei pro lado e vi que o Anderson tava morto, daí já fiquei sem sentido, sem reação. Não senti nada, apenas um choque. Doeu mais quando eu vi eles matando meu marido e eu não pude socorrer, não pude tocar nele. Eu acho que ele nem teve tempo de raciocinar o que tava acontecendo, porque ele tava meio sonolento”, declarou.
Beatriz falou que assim que os criminosos deixaram a casa, ela saiu do quarto e foi atrás da filha, uma menina de apenas 4 anos de idade que estava no imóvel.
“Ela tava na rede, no pátio, com meu irmão que tem 15 anos. Ele deu o celular pra ela se entreter e não perceber o que tava acontecendo. A minha mão tava sangrando, mas ela não tava entendendo o que tava acontecendo. O meu cunhado também tava em casa, no banheiro, e lá mesmo ficou. Eles disseram que se eles corressem, também iam matar eles”.
Marido e mulher estavam juntando dinheiro para comprar um terreno e construir a casa própria. Eles haviam se mudado do bairro Brasil Novo para a comunidade de Ilha Redonda para ficar mais perto do trabalho de Anderson.
Para Beatriz, o marido foi assassinado porque foi confundido ou porque a organização criminosa responsável pelo ato, foi induzida a acreditar que ele era integrante facção rival.
“Até agora parece que isso não é real, que não é verdade. A ficha ainda não caiu. Eu acredito que confundiram ele com algum faccionado, ou a pessoa que chamou eles, mentiu dizendo que ele era um”, ponderou.
Sobre o futuro, Bia, como também é conhecida, disse que não sabe o que fará, pois dependia financeiramente do esposo, e agora, sem os dedos da mão, terá que se adaptar às simples tarefas do dia a dia, como cuidar da própria filha.
“Eu tenho medo do futuro porque a gente dependia dele pra tudo. Agora tá tão difícil. Eu não posso voltar pra lá, não tenho pra onde ir, estou só com a minha filha, ainda preciso me adaptar a fazer as coisas pra ela só com uma mão. O pouco que a gente tinha, eu soube que entraram em casa e levaram algumas coisas”, lamentou.
Caso
Anderson Ramos, de 24 anos, foi executado na tarde do último domingo, 10, dentro de sua residência, no ramal do Bonito, a altura do km-17 da BR 210.
A barbárie foi gravada pelos próprios criminosos e ganhou repercussão nas redes sociais.
Na segunda-feira, 11, dois acusados de envolvimento no crime morreram em troca de tiros com a polícia. Eles foram identificados como Wellington Wesley Magalhães Fagundes, o “Palhacinho”, de 25 anos, e Francinei Ramos.
A ação também resultou na prisão de outros dois suspeitos, Robson dos Santos, o “Gaspar”, e Janaína Shara Assunção de Queiroz, de 21 anos, namorada de Palhacinho. Ambos foram autuados em flagrante e tiveram suas prisões convertidas para preventiva na audiência de custódia.
Agora eles se encontram no Iapen, à disposição da Justiça.
As investigações da polícia concluíram que Francinei foi quem apertou o gatilho e matou Anderson; Palhacinho foi o responsável pela tortura contra Beatriz, e Gaspar filmou a ação criminosa. Alerquina, segundo os levantamentos policiais, acompanhou tudo de perto, desde o início, e era a dona do aparelho que captou as imagens.
Uma quinta pessoa, a que teria discutido com a vítima, ameaçado e acionado o bando, segue sendo procurada.